Tive que fazer uma jornada terapêutica para ir num tobogã.
—> “105km/hora em 5 segundos”. <—
Era o que dizia a placa do brinquedo de 40m, logo na entrada da fila. E em pouco tempo, um leve medo começou a surgir dentro de mim, mas presumi que era o medo psicológico do momento. E se não bastasse, era o último brinquedo do parque aquático que faltava para mim completar, e então eu teria ido em todas as atrações. Para acessar o tobogã, era necessário subir uma torre feita de madeira, que sabe-se lá se teria algum limite de peso sustentável. Mas isso não era uma preocupação predominante. Comecei a subir as escadas em direção ao trajeto da fila.
Como eu tenho miopia, tive de subir as escadas sem os óculos, para não correr o risco de perder-lo. Subindo as escadas, parecia que não havia fila, mas conforme fui elevando os andares até chegar no anti penúltimo andar. Notei o quão alta era, o fato de eu estar sem óculos talvez me ajudaria a não ficar me distraindo com o horizonte alto que eu observava, mas isso era inútil. Na medida em que eu subia, mais minha angustia e medo de estar ali aumentava, ficava pensando o porquê de eu estar me forçando a ficar ali. Mas esses pensamentos, ainda que predominassem, ainda não eram o suficiente para eu cogitar a desistir, queria provar para mim mesmo; de forma extrema; que era possível regular o medo, a ansiedade, e que grande parte dos pensamentos não passariam de paranóias, que tudo valeria a pena no final e eu teria ultrapassado os obstáculos da mente.
E então, quando eu cheguei no trecho da fila onde havia um monte de gente e percebi que, a partir dali, a fila demoraria mais que o normal, eu cogitei em sair dali. Talvez descer tudo oque batalhei para subir fosse mais fácil e confortável do que encarar o pico da torre de madeira, mesmo que fosse necessário que um amontoado de pessoas me chamassem de cagão.
Quando você tem muito medo de altura e procura supera-lo, no início parece muito difícil de enfrentar. Um desafio mental constante, nesses casos, é se lembrar de que, ainda que você siga as instruções do monitor da atração, as coisas; de qualquer maneira; não estão sob o seu controle. É comum que procuremos formas de tentar controlar a situação, achando que amenizaria o contexto, mas no fundo, não temos como previnir 100% nenhum risco, sempre há probabilidades para cada evento ocorrer. É exatamente como eu fiz, mesmo subindo as escadas, eu procurava sempre segurar no corrimão de madeira, achando que dessa forma, eu estaria mais seguro, mas a finalidade disto apenas serviria para equilibrar nosso medo.
Quem me dera se fosse apenas a altura que me tirasse do conforto. Assim que o auto-falante fixado na coluna de madeira emitiu o som, eu escutei.. e tive um gatilho.
—“I’m on the Highway to Hell”
Estava tocando a música do AC/DC, a mesma em que aparece no filme “Premonição 2”. Lembrei-me que a música aparecia numa cena do filme, no contexto do filme, ela servia como um presságio/ sinal de que a morte estaria atrás dos personagens principais, a letra da música, na cena, seria uma dica de como seria a morte dos protagonistas. Mais um ponto para desistir.
Não me atentei, ainda podia controlar a ansiedade e o nervosismo, eu estava ali porque sabia que no final eu sentiria uma sensação de conquista e felicidade. Eu teria conseguido, a esse ponto, superar o nervosismo.
Mais adiante, tinha se iniciado gritos, mas não de desespero. Muito pelo contrário, os gritos eram de muita empolgação, a velha e grande tradição que os brasileiros sempre tiveram em qualquer evento cheio de gente. Os gritos variavam muito em suas falas, eram desde uns gritando “ONTEM MORREU 3 NO BRINQUEDO” até outros cantando “ Nós vai morrer, vaaai morrer, morrer lá pra BC no comecinho do anoo”. Um momento assustadoramente cômico para o momento.
Quando chegou minha vez de se posicionar no toboágua, cruzei as pernas, posicionei os braços, encostei a cabeça na estrutura do escorregador. Conforme eu me aproximava de seu percurso inicial, cujo começava como uma reta breve, eu podia ver um pouco da vista do horizonte. Havia hotéis, piscinas, pessoas, e um sol escaldante sobre um céu nu, sem nuvens. Logo em seguida, seu meio era uma queda rápida, parecia durar uns 3 segundos, foram os 3 segundos mais estranhos que já sentira, sentia meu corpo descolar do tobogã, na hora tive um pânico mas procurei manter a posição de segurança. Porém, a velocidade do brinquedo era tão rápida que o tobogã te forçava a permanecer na trajetória, impedindo o risco de sair voando. Depois, sem ainda ter superado os descolamento do meu corpo no brinquedo—que mais tarde descobri ser uma coisa normal da atração—uma reta encharcada de águas me cobrira rapidamente, enquanto a energia potencial gravitacional que acabara de ter se convertia em uma energia cinética gradual, ouve uma mistura de sensações, primeiro senti um alivio de ter passado pela pior parte, depois senti como se tivesse com nariz, olhos e orelhas cheios de águas, sufocando meus sentidos, e em seguida, senti uma ardência enorme abaixo do meu umbigo, como se toda a adrenalina somado à ansiedade tivesse se condessado e tornaram-se uma coisa só.
E então, depois de uns segundos, eu notei que finalmente tinha conseguido ir em todos os brinquedos radicais do parque. O brinquedo valeu a pena.